A política brasileira vive hoje uma grande expectativa sobre a reforma de previdência, com debates no Congresso ente partidos da base aliada, a oposição e demais lideranças. Trata-se de uma reforma considerada crucial pelo Governo Federal para alavancar a economia do Brasil, e que está sendo amplamente discutida por diversos setores da sociedade. Mas embora esta seja a prioridade do atual do governo, muitos também alertam para a importância de uma outra reforma: a reforma tributária.
Em 9 de abril deste, o líder do MDB na Câmara dos Deputados, Baleia Rossi, levou o economista Bernard Appy para apresentar aos parlamentares uma proposta de reforma tributária, a chamada PEC 45. Este projeto, desenvolvido pelo CCiF (Centro de Cidadania Fiscal), alteraria o sistema brasileiro de impostos sobre bens e serviços. A proposta central do texto é unificar cinco impostos, três deles federais (PIS/Confins e IPI), um estadual (ICMS) e um municipal (ISS), em um único tributo, o IVA (Imposto sobre Valor Agregado), com alíquota estimada em 20% e sem aumento de carga.
Além de simplificar o pagamento e a cobrança de impostos, desburocratizando a tributação, a meta deste projeto é destravar a economia e ajudar na retomada de crescimento. Segundo Bernard Appy, uma reforma tributária com um Imposto sobre Valor Agregado poderia gerar aumento de PIB potencial de pelo menos 10% em 15 anos. Mas ele também afirma que é necessário aprovar a Reforma da Previdência.
Além da criação do IVA, há outra proposta de reforma tributária que deve passar pelo Congresso, com autoria do Governo Federal. O projeto, elaborado pelo economista Marcos Cintra, e pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes, baseia-se na criação de um IU (Imposto Único) sobre transações financeiras, que substituiria vários outros impostos existentes. Entre alguns dos impostos extintos para a aplicação do IU estariam o IRPF e o IRPJ (imposto de renda), IPI, Cofins e ICMS (impostos sobre consumo), IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), e CSLL (impostos sobre o lucro), entre outros. Diferentemente do IVA, que se aplicaria sobre consumo (no pagamento de cada bem ou serviço consumido), o IU seria aplicado sobre transações financeiras, como pagamentos do tipo DOC ou TED, depósitos bancários e saques em caixas eletrônicos.
Atualmente
o Brasil possui 5 impostos indiretos que incidem sobre o consumo de bens e
serviços:
ICMS
(Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços);
IPI
(Imposto sobre Produtos Industrializados);
ISS
(Imposto sobre Serviços);
PIS/PASEP
(Programa de Integração Social/Programa de Formação do Patrimônio do Servidor
Público);
Cofins
(Contribuição para o financiamento da Seguridade Social).
Complexidade
e burocratização
Estes
impostos estão sob responsabilidade de diferentes esferas do governo: IPI, PIS
e Cofins são impostos Federais; ICMS é um imposto Estadual e o ISS é municipal.
Isso
significa que, além de haver vários impostos aplicados a bens e serviços, esses
impostos também devem ser pagos a destinatários distintos e em datas variadas.
Dessa forma, considera-se que a produção de bens e serviços no Brasil está
sujeita a um sistema tributário complexo e burocrático.
De
acordo com o Banco Mundial, o Brasil é o país em que as empresas mais gastam
tempo e recursos no pagamento de impostos. O estudo realizado pela Instituição
mostra que empresas brasileiras gastam quase 3 meses por ano organizando e
efetuando pagamentos de impostos.
Efeito cascata
O
fato de haver diferentes impostos sendo aplicados sobre bens e serviços ao
longo do ciclo de consumo faz com que ocorra o chamado efeito cascata. Esse
efeito consiste na múltipla tributação de um mesmo produto.
Por
exemplo, um produtor vende a um comerciante um produto pelo preço de 5 reais,
sobre os quais são acrescentados 2 reais de impostos, fazendo com que o
comerciante pague 7 reais pelo produto. Quando esse comerciante revende esse
produto em sua loja, é aplicado um novo imposto sobre o valor de 7 reais. Ou
seja, ocorre uma dupla tributação, que tem como consequência final um
encarecimento do produto.
Guerra fiscal
Outra
característica do atual sistema tributário é a chamada Guerra Fiscal.
Atualmente
os Estados e municípios possuem autonomia para determinar o valor dos impostos
que cobram. Essa liberdade na determinação do valor dos impostos é bastante
utilizada para atrair investimentos.
Na
prática, os Estados e municípios que oferecem menos impostos têm maiores
chances de atrair empresas para seu território (o que é algo benéfico para a
economia da região, pois gera empregos). Isso faz com que ocorra um “guerra
fiscal”, ou seja, uma disputa para oferecer os menores impostos e atrair o
investimento. Mas qual o problema disso? Bem, o problema é que com essa redução
dos impostos o país acaba arrecadando menos recursos para investir nas áreas
que necessitam.
DUAS PROPOSTAS DE REFORMA TRIBUTÁRIA
Em
9 de abril de 2019, Baleia Rossi, líder do MDB na Câmara dos Deputados, levou o
economista Bernard Appy para apresentar sua proposta de reforma tributária aos
parlamentares. Essa, no entanto, não é a única proposta que será discutida. O
Executivo afirmou que ainda apresentará sua própria proposta de reforma
tributária em breve, formulada por Paulo Guedes (Ministro da Economia) e Marcos
Cintra (Secretário da Receita Federal).
Rodrigo
Maia, presidente da Câmara dos Deputados, demonstrou que a Reforma da
Previdência é a primeira prioridade do governo, mas a Reforma Tributária deve
vir logo em seguida:
“Talvez
por ela [a apresentação da proposta de Appy] a gente possa recomeçar todo um
debate novamente, para que todos os novos deputados possam participar da
discussão e que, dando tempo ao tempo, ocorra desde já o debate. Mas sua
tramitação mais efetiva somente após a aprovação da reforma da Previdência.”
Sugestão:
confira também nosso post sobre a Reforma da Previdência!
BERNARD
APPY E A PROPOSTA DO IVA
Créditos:
Marcos Oliveira para Agência Senado
A
proposta já apresentada aos parlamentares, de autoria de Bernard Appy, recebe
ampla aceitação entre políticos de todos os campos ideológicos – desde João
Amoedo (Novo) até Fernando Haddad (PT).
No jogo da política, é importante enfatizar que os principais defensores
dessa proposta no Congresso são o Presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o MDB.
Essa
proposta não é exatamente novidade. Em 2008, Appy foi um dos principais
responsáveis pela proposta de reforma tributária apresentada ao Congresso pelo
governo Lula. Naquela ocasião, a proposta acabou sendo engavetada. A reforma
que ele propõe atualmente não difere muito daquela.
Nas
eleições presidenciais do ano passado, Appy se encontrou com a maioria dos
candidatos para apresentar suas ideias para reformar a estrutura tributária do
país. A grande maioria dos presidenciáveis declarou apoio a sua proposta. A
ideia central dessa sugestão de reforma, a criação do IVA (fica tranquilo,
vamos explicar isso logo abaixo!), foi defendida pelos principais candidatos à
presidência, com exceção apenas de Jair Bolsonaro.
O
ponto central da proposta é uma mudança na tributação do consumo. Sabe aqueles
5 impostos indiretos (ou seja, sobre bens e serviços) que mencionamos
anteriormente? Então, eles são o centro dessa sugestão de reforma. De forma
resumida, a ideia de Bernard Appy consiste em transformar esses 5 impostos em
um só: um IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que seria chamado de IBS (Imposto
de Bens e Serviços).
O que é o IVA?
O
Imposto sobre Valor Agregado é uma proposta para simplificar a tributação sobre
o consumo, substituindo os diferentes impostos aplicados sobre bens e serviços
por um só. Esse modelo de tributação
amplamente utilizado em todo o mundo – à exemplo de Estados Unidos, França e
Uruguai.
Conforme
mencionamos anteriormente, a atual estrutura tributária do Brasil aplica
diversas taxas ao longo do ciclo de consumo. Essa forma de taxação tem duas
graves consequências: um desperdício de recursos das empresas (que gastam muito
tempo para pagar os impostos); e um aumento no preço final dos produtos (pois o
produtor repassa ao consumidor o gasto que teve com os impostos, para garantir
seu lucro).
Dessa
forma, o IVA aparece como uma alternativa para simplificar o pagamento e a
cobrança de impostos e impedir a
múltipla taxação de bens e serviços (efeito cascata).
Sugestão:
Temos um post inteirinho explicando o IVA!
A
PROPOSTA DO GOVERNO: O IMPOSTO ÚNICO FEDERAL
Créditos:
Leo Pinheiro para Agência O Globo
Leo
Pinheiro
Além
da proposta de criação de um IVA, há ainda outra alternativa que passará pelo
Congresso. Essa alternativa é elaborada pelo economista Marcos Cintra, e
encabeçada pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes. Ou seja, trata-se da
proposta oficial do Governo Federal para reestruturar o sistema tributário do
país.
Enquanto
a proposta de Bernard Appy tinha como foco a taxação do consumo, a proposta de
Marcos Cintra prioriza as transações financeiras. De forma resumida, a ideia é
acabar com diversos impostos existentes e substituí-los por um Imposto Único,
que seria aplicado diretamente nas transações financeiras.
O que é o Imposto Único (IU)?
O
Imposto Único é um imposto criado para substituir vários outros impostos
existentes, que seriam extintos. Mas não
se engane, embora esteja sendo chamado de Imposto Único Federal, a proposta não
é literalmente essa, ainda existiriam outros impostos!
Trata-se
de um imposto aplicado sobre transações financeiras. Ou seja, quando uma pessoa
faz uma transação (DOC, TED, eletrônica) seria acrescentado sobre este valor
uma quantia referente ao imposto. Vejamos o exemplo utilizado pelo próprio
Marcos Cintra:
Se
você emite um cheque de R$ 100,00 para uma pessoa haveria um desconto em sua
conta-corrente de R$ 102,81. A pessoa para quem você passou o cheque receberia
um crédito em sua conta-corrente de R$ 97,19. Portanto, nessa transação o
governo arrecadaria R$ 5,61.
É
dessa forma que a arrecadação de impostos ocorreria no Brasil.
Conseguiu
entender a diferença operacional entre essa proposta e o IVA? Enquanto o IVA
era aplicado sobre o consumo (ou seja, no pagamento de cada bem ou serviço
consumido), o IU é aplicado sobre as transações financeiras (pagamentos do tipo
DOC ou TED, depósitos bancários, saques em caixas eletrônicos).
Quais impostos seriam extintos?
Nessa
proposta a lista de impostos que deixariam de existir é longa. Como dissemos, o
Imposto Único não será realmente o único existente, mas é quase isso!
Dentre
os impostos extintos para a aplicação do IU, os principais são, de acordo com
Marcos Cintra:
IRPF
e IRPJ (Imposto de Renda);
INSS
Patronal;
IPI,
Cofins, ICMS; (Impostos sobre consumo);
IOF
(Imposto sobre Operações Financeiras);
CSLL
(Impostos sobre o lucro).
Objetivos
e vantagens do IU
De
acordo com o economista Marcos Cintra, elaborador da proposta, a alíquota
estabelecida para ser aplicada nas transações (ou seja, o valor da taxação que
deverá ser aplicada) é pensada para
garantir que a arrecadação do governo seja mantida, sem efetiva redução da
arrecadação de impostos.
Lembra
quando falamos sobre o tempo que as empresas brasileiras gastam para pagar
impostos? Os defensores da proposta de Cintra e Guedes argumentam que o Imposto
único economizaria recursos que atualmente são gastos no pagamento dos diversos
impostos existentes no Brasil. Vale enfatizar que a proposta do IVA também
oferece esse benefício, como já mencionamos.
Os
entusiastas da proposta do Imposto Único afirmam também que a redução da
quantidade de impostos e sua unificação no IU facilitaria a fiscalização e
dificultaria a sonegação. Como a tributação ocorreria diretamente sobre as
transações financeiras, não dependendo de declaração da renda e dos lucros por
parte do indivíduo ou da empresa, não ocorreriam fraudes.
A vantagem para Estados e Municípios
Outra
característica da reforma defendida por Guedes e Cintra é o fortalecimento de
Estados e Municípios.
Em
concordância com as ideias da proposta para um novo Pacto Federativo, Paulo
Guedes defende que 70% da arrecadação do Imposto Único Federal fique com
Estados e Municípios.